Afonso Celso Garcia Reis,
mais conhecido por Afonsinho, é um médico e ex-jogador de futebol, com
passagens pelo XV de Jaú (onde foi revelado), Botafogo, Olaria, Vasco da Gama,
Santos, Flamengo, América-MG e Fluminense. Jogava como meia-armador e se destacou
principalmente no Botafogo, onde conquistou todos os títulos possíveis, 2
Cariocas, 1 Rio - São Paulo e 1 Brasileiro, sendo inclusive o capitão do time
na conquista da Taça de Prata de 1968.
Afonsinho enfrentou cartolas e a ditadura |
Apesar da habilidade e da técnica, já tendo conquistado a torcida
do alvinegro carioca, Afonsinho passou para a história por outro motivo. Pouco
antes de se transferir ao Botafogo, o Brasil sofreu um golpe que resultou no
início da Ditadura brasileira. Assim, a partir de 1968, com a
institucionalização do AI-5, o aparelho ditatorial estatal passou a reprimir e
a monitorar a sociedade civil brasileira, iniciando uma época de auge da
repressão da Ditadura.
Diversos artistas e jogadores brasileiros foram monitorados.
Afonsinho foi um dos jogadores considerados subversivos pelos órgãos
ditatoriais. O atleta tinha um visual que lembrava Che Guevara, com barba e
cabelos compridos, e ainda era estudante de medicina na Universidade do Estado
do Rio de Janeiro (UERJ), envolvido nas questões políticas de sua Universidade,
participando do movimento estudantil e se declarando socialista em plena
Ditadura.
Em 1968, na época de estudante de medicina ao mesmo tempo em que
era jogador, Afonsinho quase trocou o esporte pela luta armada. Participando
dos grupos de discussão da Universidade, acabou pensando na sua entrada para a
luta armada após um dos acontecimentos mais emblemáticos durante os anos de
chumbo: o assassinato do estudante Edson Luís Souto. As consequentes manifestações
nas ruas do Rio empolgaram o atleta que era filho de ferroviários e desde
criança, quando morava em Marília, no interior de São Paulo, convivia com
causas sociais, aprendendo dos pais a ter preocupações sociais. Afonsinho
acabou não entrando na resistência armada contra a Ditadura, mas passou a ser
cada vez mais vigiado.
Foi em 1970 que o jogador encontrou os primeiros problemas com o
Governo brasileiro. Ele foi emprestado pelo Botafogo ao Olaria, pois teria
“entrado em divergências” com a diretoria do clube. O atleta aproveitou o exílio forçado
no time emprestado para completar seus estudos em medicina e terminar o seu
curso superior. Na época, o
técnico do fogão era Zagallo, treinador da seleção brasileira na Copa de 1970,
colocado pelos militares no comando da seleção depois de substituir João
Saldanha (leia o nosso post sobre Saldanha).
Não sendo muito utilizado no Olaria, voltou no mesmo ano ao fogão,
mas foi proibido de jogar e treinar no Botafogo, sendo pedido pela diretoria
que ele cortasse sua barba e cabelos longos. Afonsinho se negou e pediu a
liberação de seu passe. Como a diretoria do time carioca não cedeu, ele entrou
na justiça e se tornou o primeiro atleta do Brasil a ganhar na justiça o
direito do passe livre, em março de 1971.
O fato foi tão marcante que Pelé, em fim carreira no Santos,
declarou em 1972 que “O único homem livre do Brasil é o Afonsinho”. Pelé
argumentou: “homem livre em futebol? Homem livre eu só conheço um: Afonsinho.
Este sim pode dizer com suas palavras que deu o grito de independência ou
morte”.
Após a conquista do passe livre, Afonsinho não teve vida fácil
para encontrar novos clubes dispostos a aceitar um rebelde jogador na situação
política pela qual o país se encontrava. Quando acertou com o Santos, em uma
excursão internacional com o time praiano do estado de São Paulo, um jornalista
o avisou que estava sendo monitorado, pois os militares acreditavam que Afonsinho
iria aproveitar para contatar socialistas em alguma embaixada.
Lutando então contra a repressão e monitoramento da Ditadura, além
de encarar os preconceitos dos clubes perante seu jeito subversivo, Afonsinho
acabou encerrando sua carreira no futebol no Fluminense, em 1981.
A revolta de um jogador contra o sistema em vigor acabou marcando
Afonsinho como um símbolo de luta pela liberdade em pleno Governo Médici, sendo
um ícone para a resistência da esquerda. Por sua rebeldia e engajamento político
acabou inspirando a música "Meio de Campo" de Gilberto Gil, gravada
em 1973, e foi tema do filme “Passe Livre”, longa-metragem dirigido por Oswaldo
Caldeira, realizado em 1974.
(por Thomaz Lemmi)
Veja ainda o documentário "Passe Livre":
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