A consolidação do regime nazista na Alemanha alterou a
economia política mundial durante longos anos. À sua memória
atrela-se tirania, genocídios, desrespeito aos direitos básicos de
qualquer ser humano e um sentimento inequívoco de repúdio ao
regimes intolerantes.
Hitler usou o futebol para enaltecer o nacionalismo |
No futebol, e na prática esportiva em geral, a atuação do nazismo foi colocada nos planos simbólicos elaborados pelo regime. Artífice de heróis
e vilões,
o regime de Hitler se valeu dos caros ideais presentes no esporte como meio de
reiteração e difusão de sua ideologia.
O regime nazista – e de certo modo a concepção alemã de
exercício físico – via no esporte uma forma de engrandecimento do indivíduo e
de aprimoramento físico-mental, o que serviria à nação, tornando-a também
grandiosa. Por outro lado, os indivíduos perniciosos e que não se enquadrassem
nos moldes do indivíduo ideal, deveriam ser excluídos da Alemanha do III Reich.
Além do interesse em formar cidadãos atléticos, a prática
social do esporte, mobilizadora de sentimentos nacionais, também era interesse
de Hitler. Não é à toa que, além da prática local, partidas internacionais
passaram a ocorrer em uma frequência muito superior à do período anterior.
Tratava-se de uma maneira de evitar o isolacionismo cultural imposto por alguns países,
assim como evidenciar a superior condição alemã eram preocupações em tais
confrontos, como nos aponta Gilberto Agostino, no livro “Vencer ou Morrer – Futebol,
geopolítica e identidade nacional”.
Foi também através do esporte que Hitler, Göring e
Goebbels consagrariam o momento de júbilo do regime: a realização dos Jogos Olímpicos
de 1936. Apoteose do esporte e da estética nazista, o III Reich se abria para
o mundo, a fim de se desnudar enquanto potência política e esportiva mundial.
Reformado, de acordo com as perspectivas arquitetônicas postas à sociedade de
massa alemã, o Deutsches Stadium
serviu de palco, no entanto, para momentos simbólicos de enfrentamento ao
regime.
No futebol, a derrota da seleção alemã nas semifinais e com estádio lotado e a "ilustre" presença de Hitler nas tribunas, seria rememorado durante muito tempo. A
eliminação para a Noruega, que contava com técnico e diversos
jogadores de origem judaica, irritou profundamente o Führer. Após o início da Guerra, Asbojorn Halvorsen – treinador da
equipe norueguesa – acabou sendo preso e levado para os campos de concentração.
No entanto, um dos momentos mais marcantes das Olímpiadas
não se relaciona com o futebol. Trata-se das vitórias do negro norte-americano Jesse Owens, que venceu os 100 e 200 metros rasos, o revezamento de 400 metros
e o salto em distância. Muito mais que um enfrentamento à teoria da
superioridade ariana de Hitler, Owens simbolizou ainda todo um repúdio ao pensamento
racista existente também no país.
Depois de uma derrota em pleno estádio Olímpico para a
Inglaterra, num jogo símbolo da política de apaziguamento levado a cabo por
ingleses e franceses, que preferiam aceitar o expansionismo alemão em vez de confrontá-lo,
a Alemanha iria à Copa do Mundo da França em 1938.
Vaiada pelos franceses, tal qual a seleção italiana, a equipe alemã que havia incorporado os jogadores austríacos, numatentativa de ser tornar superior
às demais, foi eliminada pelos suíços, dando adeus ao campeonato para a irritação do alto
comando nazista.
Iniciada a II Guerra Mundial, os líderes nazistas não
permitiram a paralização dos jogos de futebol. Convencidos da força
aglutinadora do esporte e o reforço do sentimento nacional promovido graças às
pelejas, a cúpula do III Reich incentivou jogos da seleção alemã tanto em países
ocupados quanto em áreas de influência, assim como as disputas entre os clubes
nacionais.
Tais encontros eram constantemente divulgados através de umas das
forças propagandísticas mais importantes do regime, o rádio. Com vitórias
exaltadas e as derrotas ocultadas, a constante prática futebolística ajudou a
fomentar na população um sentimento tanto de superioridade quanto de uma
aparente normalidade cotidiana.
Um dos jogos mais marcantes desse período ocorreu na Ucrânia,
entre a seleção alemã e antigos jogadores do Dínamo de Kiev. O time que ousou enfrentar os nazistas tornou-se símbolo de resistência.
Com as derrotas das forças nazistas na guerra, tentou-se
buscar no futebol uma forma de apaziguamento e tranquilização da população, mas
com a derrota final e a derrocada do regime, isso não era mais possível.
Como
inúmeros outros espaços da vida social, o futebol – assim como as artes, o
cinema e a arquitetura – foi utilizado pelo nazismo a fim de gerar uma
identificação com a ideologia. Não obstante, mesmo sendo alvo desse interesse
político, tornou-se possível para os que resistiram se valer também do futebol como
um espaço de luta contra o opressor.
(Por Thiago Kater)
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