sábado, 17 de maio de 2014

1966: seleção entra nos planos da ditadura


Desde o golpe de 1964, o projeto dos militares era transformar o Brasil numa potência e o futebol era um dos caminhos para atingir este objetivo, ainda mais após o bicampeonato de 1958 e 1962.

Atletas dos principais times do Brasil foram convocados

De acordo com o jornalista Marcos Gutterman, no livro "O futebol explica o Brasil", "àquela altura, havia plena convicção de que o Brasil, esse gigante que agora estava em “boas mãos” podia ser conduzido ao Primeiro Mundo – já que tinha o melhor futebol do planeta, para começar”.

Assim, na primeira Copa com os militares no poder, em 1966, o Brasil pintava como favorito ao título. O otimismo com relação a mais uma conquista tinha razão de ser, uma vez que a Seleção nunca perdera um jogo com Garrincha e Pelé em campo. 

Porém, diferente dos outros Mundiais em que se sagrou campeão, o Brasil não contou com uma preparação adequada e a crise política entre dirigentes contribuiu para seu fracasso.

Preparação com intromissão política prejudicou o Brasil em 1966

A disputa pelo poder em torno do escrete se dividiu entre João Havelange, presidente da Confederação Brasileira de Desportos (CBD), e Paulo Machado de Carvalho, dirigente poderoso do futebol paulista. O primeiro, em plena campanha à presidência da Federação Internacional de Futebol (Fifa) e o segundo com a imagem de "Marechal da Vitória", apelido que ganhou após o excelente trabalho como chefe das delegações campeãs de 1958 e 1962.

Na queda de braço sobre quem deveria ser o técnico da equipe que iria disputar a Copa, Havelange saiu vencedor e manteve Vicente Feola como treinador. Paula Machado de Carvalho defendia que o cargo fosse dividido entre Feola e Aymoré Moreira. Sem resolver o impasse, cada um foi para um lado.

O fato é que após a saída de Paulo Machado de Carvalho da comissão técnica, a equipe passava por um momento de oba-oba e de interferências extra-campo. Sem surpresa alguma, Havelange foi nomeado chefe da delegação em 8 de março de 1966.


Gutterman ressalta que a influência do poder político na seleção brasileira, a partir de 1966, era um caminho sem volta, uma vez que a equipe representava a “pátria em chuteiras”.  E o resultado dessa interferência foi desastroso.  "A seleção não era mais uma simples representação esportiva nacional; ela era a essência brasileira, sua expressão de força, capaz de gerar orgulho patriótico e nacionalista. No momento em que o Brasil mergulhava nas trevas institucionais, e os militares viviam uma guerra intestina para saber que rumo dar ao golpe que haviam perpetrado em 1964, o futebol consolidava-se como instrumento óbvio dos interesses dentro da malha de poder”

Com uma política nacional-desenvolvimentista, o regime militar se apoiava no nacionalismo como um dos pilares de sua agenda de governo. Para isso, precisava convencer o povo brasileiro de que o País estava em pleno crescimento.

Apoiando-se no poder dos militares, o chefe da delegação brasileira permitiu o absurdo da convocação de 45 jogadores para a fase de preparação para a Copa   (Goleiros: Gilmar, Fabio, Valdir, Ubirajara e Manga. Zagueiros: Carlos Alberto, Djalma Santos, Fidélis, Murilo, Bellini, Djalma Dias, Brito e Ditão. Meias: Pelé, Zito, Dino, Dudu, Denílson, Dias, Orlando, Leônidas, Fontana, Altair, Edson, Rildo, Paulo Henrique, Oldair, Gerson, Silva, Célio, Parada, Fefeu e Lima. Pontas: Garrincha, Jairzinho, Paulo Borges, Nado, Paraná, Edu, Rinaldo e Ivair. Centroavantes: Flavio, Servilio, Alcindo e Tostão).

Na lista, havia representantes dos principais times brasileiros, como uma forma de mostrar que a seleção era representada por todos os interesses políticos em jogo naquele período da ditadura.

No período de preparação em Lambari e Caxambu, interior de Minas Gerais, treinavam quatro equipes: vermelha, verde, branca e amarela. Sem definição dos jogadores que iriam para a Copa, a equipes excursionavam Brasil afora, aderindo à tal integração nacional do regime militar.

A vontade de agradar aos militares e seus poderes locais era tamanha que 32 jogadores viajaram rumo à Copa da Inglaterra sem saber quais seria os dez cortados. O fato é que a lista final foi fechada já às vésperas do início da competição e de forma traumática, como contou Pelé na biografia de João Havelange.

A crise na seleção era tão profunda que Vicente Feola e o supervisor Carlos Nascimento não se entendiam e os jogadores, insatisfeitos como a chefia de Havelange, mandavam cartas a Paulo Machado de Carvalho pedindo seu retorno.

O resultado da intromissão da política na seleção não poderia ser outro, que não um fiasco dentro de campo. O escrete canarinho fez uma campanha tão fraca quanto a do vexame histórico de 1934, quando o País não passou da primeira fase. Na estreia. bateu a Bulgária por 2 a zero, na última partida de Pelé e Garrincha juntos. Depois perdeu por 3 a 1 para a Hungria e acabou sendo eliminada por Portugal, após um sonoro e traumático 3 a 1.

O desastre na Copa da Inglaterra serviu de lição. Havelange e os militares não cometeriam o mesmo erro no próximo Mundia;. Mas esta, é uma outra história.

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Para saber mais sobre o assunto, leia os livros "O futebol explica o Brasil", de Marcos Gutterman; "Jogo Duro", de Ernesto Rodrigues e "O Marechal da Vitória", de Tom Cardoso e Roberto.Rockman.

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