segunda-feira, 2 de junho de 2014

Um coro contra a ditadura no estádio Centenário

Como outras ditaduras latinas, o Uruguai foi mais um dos países que tentou usar o esporte como meio de autopromoção e de legitimação de seu sistema político. 

Arquibancada do Estádio Centenário vibrou contra a ditadura uruguaia

A Copa do Mundo de 1970, vencida pelos brasileiros, foi o primeiro exemplo aos uruguaios de que uma grande vitória no futebol ajudava a firmar um regime de exceção. 

Mas, foi no Mundial de 1978, na Argentina, que o Uruguai aprendeu como usar o esporte na política. Afinal, os hermanos, após uma série de manobras, conseguiu se garantir como sede da Copa de 78, mesmo quando diversas organizações divulgavam os assassinatos cometidos pela ditadura de Jorge Videla.

No fim, o torneio ficou marcado pelas suspeitas de interferência do regime militar, especialmente depois do famoso jogo contra o Peru, onde uma goleada de 6 a 0 classificou o time da casa para a final, ajudando-o a levantar a taça e reforçar os desmandos dos militares.

De olho nesses benefícios do futebol à política, no ano seguinte foi a vez da ditadura uruguaia se utilizar desse subterfúgio. Pena que deu errado!

Com chancela da Fifa, foi criada a Copa de Ouro dos Campeões Mundiais, um mundialito para comemorar os 50 anos do primeiro Mundial, sediado e vencido pelos uruguaios em 1930. 

Assim, seguindo o mesmo formato das Copa, o Mundialito de 1980 foi disputado pelos então seis campeões mundiais: Alemanha, Itália, Argentina, Brasil, Uruguai e Inglaterra. Os britânicos se recusaram a participar da disputa e sua vaga foi cedida à Holanda, vice-campeã dos dois Mundiais anteriores (1978 e 1974).

Governado com mão de ferro pelos militares, o regime uruguaio pensava na competição como uma grande oportunidade de melhorar sua imagem perante o povo e a comunidade internacional, que criticavam as restrições à liberdade e pedia o fim da ditadura. 

A comemoração do cinquentenário da primeira Copa era tão certa aos olhos dos militares, que o primeiro ato do regime militar foi marcar um plebiscito para 1980, semanas antes do início do Mundialito, com propostas de mudanças na constituição. A ideia era que o povo votasse “sim” ou “não” pelo aumento do poder ditatorial. Mas o tiro saiu pela culatra. 

Um mês antes da Copa de Ouro, o plano dos militares foi por água abaixo quando as urnas apresentaram uma vitória esmagadora da não continuidade do regime no plebiscito.


Mesmo jogando bem e vencendo a final contra o Brasil por 2x1, o Estádio Centenário entoou uma comemoração diferente. Em vez de um sonoro “É campeão”, o povo cantava a plenos pulmões: “vai acabar, vai acabar a ditadura militar”. 

Sem poder fazer nada, os militares engoliram o sapo e começaram a preparar a retirada do poder, que foi concluída em primeiro de março de 1985. Neste caso, o futebol serviu como um grito de esperança para um povo. Que foi coroado com a vitória em campo e nas urnas.



(por Thomaz Lemmi)

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Para saber mais sobre o assunto, assista ao documentário "Mundialito", do cineasta Sebastián Bednarik.





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