domingo, 22 de junho de 2014

Depoimento: Álvaro Caldas

"A paixão pelo futebol mobilizava muito, mas a gente ficava com dúvida de manifestar uma euforia com isso"


O jornalista Álvaro Caldas foi militante do Partido Comunista Revolucionário Brasileiro (PCBR). Trabalhava no jornal O Globo, mas foi demitido por ter sido visto em uma manifestação no Rio de Janeiro.

Álvaro Caldas

Nesse período, manteve a militância em paralelo ao trabalho como repórter do Jornal do Brasil. A queda de alguns companheiros acarretou na sua prisão em 1969. 

Em razão disso, durante a Copa do México, em 1970, estava preso no quartel militar Regimento Sampaio. Nas celas daquele local, acompanhou os lances da campanha do Brasil rumo ao tricampeonato Mundial.

Em depoimento para o documentário da exposição "Política F. C. - o futebol na ditadura", que pode ser assistido na mostra, ele comenta como os presos políticos do Regimento Sampaio encararam a torcida pela seleção naquele período.

"A gente começou a acompanhar a Copa, mas com um sentimento muito ambíguo, muito duvidoso. A gente sabia que estava sendo explorado o sucesso da Copa. Tinha uma seleção maravilhosa em 1970, como poucas vezes. Talvez, tenha sido a melhor seleção brasileira de todos os tempos, com Pelé, com Gérson, com Rivellino, com Clodoaldo, um timaço! Com Tostão...

Então era um time... A paixão pelo futebol mobilizava muito, mas a gente ficava com dúvida de manifestar uma euforia com isso. Quando chegava um soldado de dizia: 'O Brasil ganhou'. A gente: 'Ah, é? Está bom!'. Mas não era aquela coisa de levantar os braços e comemorar, porque a gente também via que a ditadura, o Médici, soube aproveitar o sucesso da Copa. E tinha, o que mais irritava, era aquela musiquinha.

E aquilo tocava no alto-falante do quartel e a gente ouvia pelos rádios ali também: "Pra frente Brasil, salve a seleção". Era um canto bem de euforia, bem de aproveitamento, como se a seleção fosse o país e o país fosse a ditadura.

O que compensou um pouco foi que a gente depois ficou sabendo que houve manifestações, como agora se prevê para essa Copa. Houve depredações, houve quebra de ônibus, houve algumas manifestacões na rua, de protesto, não sei exatamente se foi de protesto contra a seleção, mas para nós aquilo foi 'tambem teve isso: o pessoal protestou também, não só comemorou'."





(Por Vanessa Gonçalves)


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